30 anos da morte de Dener: puro talento que faz falta ao futebol brasileiro

Publicidade
Publicidade
Publicidade
Mais
Publicidade
Publicidade
Publicidade

Morte de Dener completa 30 anos com legado de puro talento que faz falta ao futebol

Dener vivia grande momento quando sua carreira foi interrompida
Dener vivia grande momento quando sua carreira foi interrompidaPortuguesa
Neste 19 de abril de 2024, são completados exatos 30 anos da morte de Dener Augusto de Sousa, uma das maiores promessas do futebol brasileiro.

Sua vida foi interrompida prematuramente quando ele estava prestes a completar 23 anos, após um acidente na lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro, em viagem de volta de São Paulo. Dener ocupava o banco do carona de um Mitsubishi Eclipse que era dirigido por um amigo, que dormiu ao volante.

Dener estava prestes a fechar contrato com o Stuttgart, da Alemanha, onde teria um grande desafio de tentar se destacar na Bundesliga, em busca de passos maiores no futebol europeu. A Portuguesa foi o clube que ele mais defendeu, tendo também vestido as camisas de Grêmio e Vasco. Neste dois últimos clubes, foi campeão estadual, mas atuando por pouco tempo. 

No acidente, que teve o cinto de segurança como adversário, ficou pelo caminho uma história de um jogador que tinha tudo pra ir muito longe pelo talento e potencial. Dener poderia ter tido um outro destino caso estivesse na lista de convocados da Seleção, que estava em Paris naquele mesmo dia, para um amistoso que teve Ayrton Senna dando o pontapé inicial. Este "se" e outros seguem sendo lamentados, até hoje, por tudo que poderia ter acontecido na vida do jogador. 

Adversários passaram aperto

Quem viu, jogou contra e a favor, sabe que estava diante de um jogador especial e diferente. 

"Ele era muito talentoso e agressivo, sempre com jogadas verticais, de muita movimentação. Fazia jogadas pelos lados e pela parte central do campo, não ficava fixo e costumava incomodar os zagueiros centrais, como eu.

"Sempre chegava em alta velocidade, com tabelas e tramas envolventes, nas transições de contra-ataque. Ele era muito hábil e veloz, tinha uma condução de bola fácil e rápida", lembra Wilson Gottardo, ex-zagueiro que enfrentou Dener em algumas oportunidades.

"Era preciso um jogador no combate e outro na sobra, ele levava muita vantagem por sua velocidade", lembra o zagueiro.

Outro defensor que foi obrigado a lidar com Dener foi Ricardo Rocha, experiente zagueiro com passagem por Real Madrid, Sporting, grandes clubes do futebol nacional e Seleção. "Ele tinha a ginga do brasileiro, muita velocidade, aliada a habilidade, técnica e força também", resume Rocha. 

Difícil de segurar

Quem também sofreu com Dener foi Nonato, ex-lateral-esquerdo do Cruzeiro, que teve a ingrata missão de marcá-lo na final da Copa do Brasil de 1993 contra o Grêmio. 

"Ele era ágil e tinha muita habilidade, driblava fácil e com rapidez. Era um cara diferente. Marcá-lo era complicado, foi um dos adversários mais difíceis de anular", lembra o lateral. 

Gottardo e Nonato tiveram o trabalho de ter Dener como adversário. Quem esteve ao seu lado, sabia que tinha, no mesmo time, uma válvula de escape pronta para resolver uma partida a qualquer momento.

"Ele tinha um futebol diferente, era ofensivo o tempo todo. Lembrava Neymar e Edílson, mas acho que era ainda mais rápido. Ele poderia chegar muito longe, tinha um futuro brilhante pela frente", coloca Silas, ex-meia do Vasco e da Seleção na década de 1980 e 1990. 

Na memória

Alguns dos gols mais bonitos da carreira de Dener resumem o que ele podia aprontar em campo. Com a bola no pé, tinha um arranque vigoroso e uma velocidade que poucos conseguiam acompanhar para alcançá-lo. Aos 19 anos, foi eleito o craque da Copa São Paulo de futebol júnior pela Portuguesa, ajudando a Briosa a faturar o título do importante torneio de base. 

Vê-lo de perto era um privilégio, mesmo em jogo para públicos pequenos, que não impediam que seus feitos o fizessem ser aplaudido de pé. Contra a Inter de Limeira, pelo Campeonato Paulista de 1991, Dener pegou a bola no meio-campo antes de costurar a zaga adversária, superando os oponentes e o gramado irregular do Canindé para marcar um gol antológico. Naquele mesmo ano, foi convocado por Paulo Roberto Falcão para a Seleção principal. 

Contra o Santos, em 1993, ele também aprontou das suas. Depois de receber no meio-campo, ele iniciou uma veloz arrancada, colocando a bola por entre as pernas do lateral-direito Índio. Dener se protegeu ao acertar o rosto do último marcador, antes de driblar o goleiro Edinho e fazer mais um gol de placa, que ratificou seu puro talento com a bola nos pés. 

"Pude vê-lo jogar por várias vezes nos dois anos em que defendeu a Portuguesa. Vi, in loco, o gol da sua vida, contra a Inter de Limeira. A sensação era que ele jogava para públicos menores do que merecia.

"A torcida da Portuguesa o tratava com um enorme carinho, mas acho que o clube falhou com ele por não ter dado asas como merecia. Ele foi emprestado por duas vezes para Vasco e Grêmio, mas seu potencial era pra atuar em clubes como Flamengo e Corinthians. Contra o Santos, ele passa por metade do time, as lembranças são claras até hoje pra mim", conta Flávio Gomes, jornalista e torcedor da Lusa. 

Até onde iria?

Imaginar onde Dener poderia chegar na carreira é um exercício de futurologia, que de pouco adianta nos dias de hoje. Dener, se tivesse chegado ao futebol alemão, encontraria um contexto bem diferente do atual, tendo totais condições de galgar novos degraus e atingir clubes ainda mais importantes do Velho Continente. 

"Acho que ele tinha tudo para quebrar o pragmatismo do futebol alemão da época. Acho que seu futuro dependeria muito de possíveis convocações, até mesmo para a Copa de 1994. Ele merecia estar lá", conta Gomes. 

Dener faleceu a 60 dias do Mundial dos Estados Unidos. Meses antes de sua morte, Dener chamou atenção de Maradona, que esteve em campo como adversário, em excursão do Vasco pela Argentina. "El Pibe" fez questão de cumprimentá-lo após o jogo contra o Newell's Old Boys. 

"Ele chegaria perto do que vemos hoje com Vini Jr. e Endrick. Seria importante ele ter uma rede de apoio porque era um garoto simples, vindo da periferia de São Paulo. Acho que tinha tudo pra chegar longe", lembra o jornalista.

Momento mágico foi interrompido

Mais convocações certamente estariam no caminho do jogador, que teria seu talento reconhecido com chances de voos ainda mais altos a curto, médio e longo prazo. "Seleção, Copa do Mundo e Europa eram alguns dos seus possíveis destinos. Ele estava em um momento mágico", lembra Ricardo Rocha, que pôde conviver com Dener no Vasco.

"Ele era tímido, mas muito do bem. A gente conversava muito, morávamos no mesmo condomínio e eu tocava em sua casa quase todo dia pela manhã para não deixar que ele se atrasasse. Muitas vezes, íamos juntos para o treino. Eu fui um irmão mais velho, chegamos juntos no Vasco", cita Rocha. 

"Eu tentava mostrar pra ele a responsabilidade de estar numa Seleção, eu já tinha ido para uma Copa e falava muito da chance que ele teria de estar na Copa de 1994. Ele jogava demais, era um cracaço, eu era fã dele. Foi uma pena ter morrido tão jovem. Ele me marcou bastante, eu ficava feliz que ele me escutava bastante", reforça o ex-zagueiro. 

Barreiras de uma realidade conturbada

Dener era de uma família humilde, tendo perdido o pai com apenas oito anos de idade. Ele e os irmãos se viram obrigados a começar a trabalhar para sustentar a família. 

Para Gottardo, o futuro de Denner tinha uma barreira: a vida social. "Até onde sei, ele não tinha uma vida regrada, costumava se descuidar na vida pessoal, o ciclo de amizades era meio nocivo e isso poderia não contribuir para o seu futuro. Ele sempre foi responsável pela manutenção da família, mas não sei se teria tido sorte de ganhar muito mais dinheiro.

"A vida de atleta não condiz com uma vida social agitada e isso poderia atrapalhá-lo. Mas seu futebol era, definitivamente, para defender grandes clubes da Europa", sentencia o ex-zagueiro. Dener chegou a ser detido, por furtos e danos, com outras cinco pessoas, quando tinha 16 anos, precisando de apoio dos clubes e de companheiros para não ver seu talento ser desperdiçado.

Apesar do potencial, Dener viu seu caminho ser abreviado quando uma venda para o futebol europeu poderia transformar sua vida. Já são 30 anos de uma história que tinha tudo para gerar capítulos memoráveis, do tamanho dos gols marcantes que fez. Dener se foi com a velocidade de suas pernas, deixando para trás muitos adversários e mantendo uma história viva de um talento que não costumava aparecer com frequência.